terça-feira, 1 de maio de 2012

Aforismos 103 e 109 - Livro II

Aforismo 103: “Há dois tipos de negadores da moralidade”

Nesse aforismo Nietzsche parte da tese de existirem dois tipos de negadores da moralidade: 

O primeiro tipo não acredita que as ações são estimuladas (impelidas) por valores morais, ou seja, esta perspectiva afirma que a moralidade repousa sob erros grosseiros ou sutis dos seres humanos, ou como o próprio filósofo alega os “embustes de si mesmo”. Nesse sentido La Rochefoucauld assenta toda sua crítica à moral como falsa; afirma que qualquer ação não passa de puro egoísmo usando as virtudes, por exemplo como máscaras para efetivar seu interesse. Todavia tomando a moral como fruto de uma falsidade, pode-se ainda assim alegar que essas ações falsas mesmo sendo estimuladas por um fator não virtuoso podem acarretar em ações ditas como boas, ou louváveis.  

O segundo tipo nega que a moralidade possa repousar sobre juízos morais verdadeiros, isto é, afirmar que não se pode fundamentar a moral em um âmbito metafísico, por exemplo;ou sustentar que qualquer juízo moral  possa ser fundamentado pela razão ou por qualquer outro motivo que dê um critério de verdade aos atos morais. Esta é a posição de Nietzsche; embora ele acredite que a desconfiança do primeiro ponto de vista é justificada e de grande utilidade geral. Nietzsche nega os pressupostos da moral do mesmo modo como nega a alquimia, no sentido de ter alguma veracidade no mundo, mas não pode negar que tenha havido alquimistas que acreditassem nesses pressupostos e agira de acordo com eles. O filósofo também nega a imoralidade alegando que muitas ações imorais devem ser evitadas e combatidas, da mesma forma que defende que muitas consideradas morais devem ser praticadas e promovidas.  

No final do aforismo Nietzsche deixa uma proposta: temos de aprender a pensar de outra forma; e posteriormente sentir de outra forma. Essas são alegações que irão se desenvolver no último período filosófico de Nietzsche, mas que em Aurora já se encontram tais inquietudes de forma embrionária. 


Autor: Wagner França 

Aforismo 109: “Autodomínio e moderação, e seu motivo último”

Nesse aforismo Nietzsche descreve seis métodos de combater a veemência de um impulso.

Primeiro método: “pode-se evitar as ocasiões para satisfazer o impulso e, através de longos, cada vez mais longos períodos de não-satisfação, enfraquecê-lo e fazê-lo secar.”.

Segundo método: “pode-se fixar uma estrita regularidade na sua satisfação”.

Terceiro método: “entregar-se deliberadamente á satisfação selvagem e irrefreada de um impulso, para vir a ter nojo dele e, com este nojo, adquirir poder sobre o impulso”.

Quarto método: “há um artifício intelectual que é ligar firmemente á satisfação um pensamento muito doloroso, de modo que, após algum exercício, o próprio pensamento de satisfação é sentido como doloroso”.

Quinto método: “a pessoa faz um deslocamento de suas quantidades de energia, ao impor-se um trabalho particularmente duro e cansativo ou sujeitar-se deliberadamente a um novo estímulo e prazer, guiando assim para outros canais os pensamentos e o jogo das forças físicas.”.

Sexto método: “quem suporta e acha razoável enfraquecer e oprimir toda a sua organização física e psíquica, alcança naturalmente o objetivo de enfraquecer um determinado impulso veemente”.

Concluindo seu pensamento da seguinte maneira: “mas querer combater a veemência de um impulso não está em nosso poder, nem a escolha do método, e tampouco o sucesso ou fracasso desse método. Em todo este processo, claramente, nosso intelecto é antes o instrumento cego de um outro impulso, rival daquele que nos tormenta com sua impetuosidade”.

Leituras necessárias para o próximo encontro

Livro II
Aforismo 112 - Contribuição á história natural do dever e do direito. 
Aforismo 115 - O assim chamado "Eu".
Aforismo 116 - O desconhecido mundo do "sujeito".